:: O Instituto >> Como surgiu o movimento existencialista
Nas primeiras décadas do século XX, o mundo estava em crise. A filosofia também. O mundo vivia a esperança de um mundo mais livre e mais justo, porém a descrença política e a idéia de história como progresso abalava a possibilidade da liberdade. As guerras, a revolução sexual, o anseio de liberdade dos povos oprimidos. Essa força desses fatos históricos foi muito mobilizada.
A filosofia passa a incorporar as discussões sociais, éticas e existenciais desse período. A falta de crença, não fazendo Deus como presença, o homem contemporâneo sente toda solidão, percebe que constrói seu próprio destino, isto o angustia. Vivencia sentimentos de vazio e desamparo, e parte em busca do sentido da Existência; o que marcaria profundamente o movimento Existencialista.
O Existencialismo surge como uma tomada de posição de alguns pensadores (filósofos europeus) frente ao cientificismo que se desenvolvia na época. Mas é claro que não se trata de negar a importância da Ciência e nem se opor à metodologia científica. A oposição justamente como o próprio movimento diz é discutir a existência do homem nas relações que ele estabelece no mundo, bem como o modo como a Ciência se fundamenta para conhecer este Homem.
A aplicabilidade dos procedimentos científicos utilizados nas ciências naturais reprimem o homem a mesma categoria de outros seres vivos, como animais e plantas. Uma vez que ao estudá-los ou através da observação, classificação e generalização estariam avaliando o homem também dessa maneira.
Nessa mesma época a área da Psicologia se importava com o modo de ser do homem, agregado a duas correntes:
A Psicanálise
O Behaviorismo
A primeira se dispunha conhecer o homem valorizando o subjetivismo da mente (a psiquê) o inconsciente, os conceitos abstratos, a memória, a inteligência e a percepção. O corpo do homem era coisa à parte.
A segunda se dispunha a conhecer o homem balorizando o racionalismo através das relações causais entre S - R que se declaravam através dos comportamentos frente ao mundo externo e real. No meio de toda essa crise surge o movimento Existencialista que acreditaque o homem não deve ser observado, destrinchado, revisado como um objeto qualquer na cadeia dos seres vivos.
Este movimento acredita que o homem, por possuir uma natureza singular, particular, intransferível e tão diferente dos outros seres vivos, deve ser abordado, avaliado e conhecido através de outros métodos (entendido aqui esta palavra, do antigo grego META-ÓDOS que significa, o caminho que conduz para ver o que simplesmente se mostra, considerando sua experiência vivida).
O que o Existencialismo contempla, no âmbito das Ciências Humanas.
O Existencialismo propõe então para as Ciências Humanas encontrar outros postulados para conhecer o homem, considerando o seucontexto histórico a má realidade e as circunstâncias que o movem para viver no mundo com os “outros” e a relação que ele fez a partir do seu vivido.
A proposta desse movimento é de fazer uma reflexão de quais seriam as características essenciais do ser humano, para a partir daí, estabelecer procedimentos metodológicos que alcancem a compreensão da sua experiência vivida, questionando sobre o seu existir concreto no mundo e na sua cotidianidade.
Assim, o Existencialismo declara a importância de se levar em conta outros aspectos da constituição do homem, além daqueles considerados pela Ciência e pelos profissionais da Educação e da Saúde.
O que devemos considerar em sua contribuição na Psicologia e nas áreas afins.
O homem não é um ser apenas dotado de racionalidade, de inteligência e de sensação.
Ele não é só dotado de realizar associação e de organizar o que se relaciona com o seu meio, ou seja, ele não é pura racionalidade.
Ele também não é pura subjetividade, onde não conhece o seu vivido, não basta ter um aparelho psíquico, desconectado do corpo, que é mais que um organismo.
O homem tem uma experiência vivida, da qual só ele é autor desta realidade, ele constrói os sentidos da sua vida.
O homem é transcendência, na medida que tem história, que não é linear e nem acabada, mas é construída em forma de espiral, pois lembra, associa a partir do seu vivido. Ele é capaz de viver um tempo que transcende o cronos, ele é Kairós.
O homem é percepção totalizante, seu corpo, sua mente, sua alma formam uma unidade indivisível, ele não é uma cômoda cheia de gavetas desconectadas, muito menos é ignorante por não conhecer a chave de seus segredos; ele apenas repousa suas experiências sofridas como um modo de sobreviver ao sofrimento, ao esvaziamento; preservando-as num suposto esquecimento.
O homem percebe, julga, sente, valora, tem hábitos, formas de dizer, e manifestações desse dizer que não são atos do momento, mas são expressões latentes que circulam o seu passado que já foi; e um estar por vir.
A Ciência Natural do modo que é constituída, departamentaliza o homem e não alcança o seu vivido.
O homem é o único ser que vivencia a sua história, e tem liberdade de mudá-la desde que banque as faturas da vida.
A vivência é a base fundamental na construção do conhecimento do homem; pois o homem está sempre em relação com os outros; e não somente a sua consciência. O homem não tem corpo, ele é um corpo que abarca seu mundo e suas significações.
O homem age, pensa, julga pela intencionalidade; ele visa o seu vivido.
O homem é homem porque é existente, porque é capaz de vivenciar, experienciar e transformar seus próprios sentidos de vida.
A Psicologia Existencial aparece então como a terceira tendência; como uma tendência integradora que propõe olhar para o homem totalizante e não dividido, indicando uma nova concepção de homem e mundo; diferente da concepção adotada pela Filosofia Moderna, pela Psicologia Científica, pela Psiquiatria Tradicional e pela Psicanálise.
Assim o movimento existencialista, surge como um modo de recolocar o homem em sua morada original, a sua Existencialidade, questionando até que ponto os sistemas teóricos que se propõem a compreender o homem nas relações que ele estabelece no mundo, seguem modelos de causa e efeito, onde tendem a explicar, a generalizar, a classificar, a rotular, desconsiderando o modo Constitutivo do homem de experienciar o vivido.
Como a experiência vivida é particular, pessoal e intransferível, não cabe encaixar o homem em sistemas teóricos que se propõem a vê-lo a partir de uma lista de sintomas e comportamentos, quantificações, e mensuração para conhecê-lo e compreendê-lo.
O conhecer não é mensurado, nem tanto quantificado; o vivido é descrito pelo cotidiano, é relacionado com o contexto de experiência navegando nos tempos do passado, do presente e do futuro que está por vir.
Desse modo, o movimento Existencialista se propõe a priori, questionar as verdades absolutas e paradigmáticas com respeito ao “conhecer do homem”, questionando. O que de fato constitui o ser do homem? É possível mensurá-lo como um animal? Como cobaia ambulante? Ou um aparelho psíquico desprovido do contexto da Corporeidade, e da multiplicidade de sentidos existenciais?
O Existencialismo se propõe a refletir em que bases sustentam o conhecer do homem, considerando sua experiência nas várias manifestações de expressar a sua existência. O ser é um ser de possibilidades.
A matriz do conhecimento do homem, é a percepção, os órgãos dos sentidos se correlacionam; o corpo não é mero organismo, é existencial, o corpo é considerado como resenha do espaço do tempo, do mundo vivido com os outros; ele é unificador e é vivido unificado. O corpo é a possibilidade que temos para nos conectarmos com os outros e com o mundo. Neste sentido diz-se que as coisas “se pensam” em cada ser, porque não é um pensar intelectual, mas sim um pensar pré-emocional que abarca uma logicidade, ele é a síntese dos sentidos existenciais que vivo e não o que penso.
O que isto quer dizer? Que os pensadores (filósofos da época) convocaram a Psicologia e as Ciências Humanas, a repensar tudo de novo, em dois pontos fundamentais:
Refletir sobre o que constitui o homem. O que ele é? E como ele funciona?
Articular e pensar numa ciência cujo método possa contemplar a existência do homem na sua cotidianidade.
Os dois pontos convergem em um único.
Como é este ser – o homem – em sua estrutura ontológica? Qual ou quais são os procedimentos que contemplam o existir e os sentidos desse existir? Como ter acesso a este ser, tão diferenciado de outros seres vivos?
Refletir sobre o ser do homem, discutir e estabelecer uma visão de homem e de mundo, foi a grande contribuição do método fenomenológico existencial, que se propõe assentar-se nos fundamentos da filosofia enquanto um caminho rigoroso, pois escolhe pensar e alinhavar o Modo Constitutivo do homem, para desconsiderar a sua experiência vivida, seu contexto histórico cultural e social.
A Fenomenologia considera que o homem e todos os outros entes (coisas, seres vivos) são uma unidade inseparável, pois só o homem é capaz de existir dando significado, manifestando e expressando sua linguagem nas várias formas desse dizer, ele expressa a roupa dos dois lados, o direito e o avesso das relações que ele atribui na vida.
Assim sendo, compreender o Existencialismo se faz necessário compreendê-lo como um conjunto de todos os sistemas filosóficos que se ocupam “por em questão a existência humana”, buscando analisar o viver concreto do homem aprofundando-se na análise da sua própria existência, revelando a sua estrutura constitutiva.
O homem é presença, que está em relação com; ele é o único doador de sentido, atribuindo significados consigo e com os outros.
Compreender o ser do homem, passa a ser uma tarefa hermenêutica.
O homem está sempre frente a alternativas diante das quais deve fazer escolhas. A escolha traz inquietações, a angústia se faz presente porque o homem sabe que não pode tomar duas direções. Diante das alternativas da vida, ele deverá eleger uma, e essa eleição comprometerá o seu destino para assumir todos os seus entrelaçamentos e desdobramentos frente ao seu projeto existencial.
Profª Ms. Danuta D. Pokladek - Presidente do PsicoEthos